Conhecemos, pois, algo deslumbrante a respeito do homem. Entre outras coisas, conhecemos a sua origem e quem ele é – criado à imagem de Deus. É o homem maravilhoso não apenas quando é “nascido de novo” como um cristão, é também maravilhoso como o fez Deus a Sua própria imagem. Tem o homem valor e dignidade em função daquilo que foi originalmente, antes da Queda.
Estava, há pouco, fazendo uma série de preleções em Santa Bárbara, quando me foi apresentado um rapaz viciado em entorpecentes. Era um jovem de semblante delicado e expressivo, cabelos longos e encaracolados, os pés calçados com sandálias, e trajava calça rancheira. Assistiu a uma das preleções e confessou: “Isto é completa novidade para mim; nunca ouvi coisa alguma igual a isto”. Voltou na tarde seguinte e eu o saudei. Olhou-me firmemente nos olhos e disse: “O senhor me cumprimentou de maneira tocante. Por que me tratou assim?” Respondi-lhe: “é porque eu sei quem você é – sei que você foi criado à imagem de Deus”. Em seguida tivemos uma demorada e notável conversa. Não podemos tratar as pessoas como seres humanos, não podemos vê-las no alto nível da verdadeira humanidade, a menos que conheçamos realmente a sua origem – quem são. Deus diz ao homem quem ele é. Deus nos declara que Ele criou o homem à própria imagem. Portanto, o ser humano é algo maravilhoso.
Diz a Bíblia que você é maravilhoso porque é feito à imagem de Deus e degradado porque, em determinado ponto espaço-temporal na história, o ser humano caiu. O homem da Reforma sabia que a criatura marcha rumo ao Inferno em razão da revolta contra Deus. Todavia o homem da Reforma e aqueles que após a Reforma forjaram a cultura do Norte Europeu sabiam que, enquanto o homem é moralmente culpado diante do Deus que existe, ele não é o nada. O homem moderno tende a julgar-se ser nada. Aqueles, entretanto, sabiam que eram exatamente o oposto do nada porque conheciam o sentido de serem feitos à imagem de Deus. Embora decaídos e, a parte da solução não-humanista de Cristo e Sua morte substitutiva, iriam para o Inferno, isto não significava, contudo que eram nada. Quando a Palavra de Deus, a Bíblia, veio a ser ouvida, a Reforma teve resultados tremendos, tanto nas pessoas individualmente, que se tornavam genuínos cristãos, como na cultura em geral.
O que a Reforma nos diz, pois, é que Deus falou nas Escrituras tanto acerca do “andar de cima” como do “andar de baixo”. Falou em verdadeira revelação acerca de Si mesmo – as coisas celestiais – e falou em verdadeira revelação a respeito da própria natureza – o cosmos e o homem. Portanto, tinham os Reformadores uma real unidade de conhecimento. Eles simplesmente não tinham o problema renascentista de graça e natureza! Obtinham real unidade, não que fossem mais sagazes, mas porque alcançavam uma unidade cuja base se achava no que Deus revelara em ambas as áreas. Em contraste com o Humanismo que Tomás de Aquino liberara e o Humanismo que o Catolicismo Romano fomentara, não reconhecia a Reforma qualquer porção autônoma.
Não queria isto dizer que não restava liberdade para a arte ou a ciência. O oposto é que era verdade; havia agora a possibilidade da verdadeira liberdade dentro da forma revelada. Contudo, ainda que haja liberdade para a arte e a ciência, não são elas autônomas – o artista e o cientista também se acham debaixo da revelação das Escrituras. Como se verá, sempre que a arte ou a ciência procuraram fazer-se autônomas, certo princípio sempre se manifestou – a natureza “devora” a graça e, consequentemente, a arte e a ciência bem logo começaram a parecer destituídas de significação.
Temos, pois, no pensamento da Reforma um homem que é alguém. Vemo-lo, porém, envolvido numa condição de revolta e a rebeldia é real – jamais uma “peça de teatro”. Uma vez que é um ser não programado e de fato se revolta, ele incide em genuína culpabilidade moral. À vista disto, os Reformadores compreenderam algo mais. Tiveram uma compreensão bíblica da obra de Cristo. Compreenderam que Jesus morreu na cruz em função substitutiva e em ação propiciatória a fim de salvar o homem da verdadeira culpa que sobre ele pesa. Necessitamos reconhecer que, no instante em que nos pomos a alterar a noção bíblica da verdadeira culpa moral, seja falsificação psicológica, seja a falsificação teológica ou seja de qualquer outra forma, nosso conceito da obra de Jesus não mais será bíblico. Cristo morreu pelo homem que tinha uma culpa moral verdadeira por ele próprio ter feito essa real e verdadeira escolha.
Excerto extraído do livro A Morte da Razão, de Francis Schaeffer
O homem já morreu. Deus já morreu. A vida se tornou uma existência sem significado, e o homem não passa de uma roda na engrenagem. A única via de escape passa por um mundo fantástico de experiências, drogas, absurdos, pornografia, uma “experiência final” elusiva, e de loucura. Se esta é a mentalidade do século vinte, como aconteceu? E como podemos fazer com que a fé cristã tenha sentido para o mundo de hoje? Dr. Schaeffer, Diretor do Comunidad L’Abri na Suíça mostra o histórico de como a arte e a filosofia têm sido o espelho do dualismo existente no pensamento ocidental desde o tempo da Renascença. Hoje, este dualismo se expressa no desespero quanto ao descobrir o racional, e no escape para o mundo não racional que é o único que oferece alguma esperança. Esta tendência é vista na literatura, na arte e na música, no teatro e no cinema, na televisão e na cultura popular.
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